Eu gostava de ter inaugurado a minha participação neste blogue (e aproveito para agradecer publicamente o convite) a dizer bem de alguma coisa. No entanto eu não tenho muito jeito para dizer bem, é a dizer mal que me vou safando, vergastando com técnicas retóricas aprendidas ora obrigado e com grande maçada em seminários obrigatórios, ora voluntariamente e com prazer, lendo Cícero e Platão e outros (fica sempre bem uma tirada pedante a abrir). Ora eu não sei se o sr. Scolari e/ou os seus satélites bigodudos tiveram formação na área, mas de uma coisa estou certo: conseguiram criar um mito que será difícil destruir, e que minará o trabalho de qualquer seleccionador que lhe vier a suceder - o mito de que há um futebol português antes de Scolari e um futebol português depois de Scolari. E isto, dizia, minará o trabalho de qualquer seleccionador que lhe vier a suceder. Independentemente da nacionalidade - e isso da nacionalidade para mim tem tanto valor como o futebol (?) do Purovic.
Não sei de onde terá partido, mas há uma tremenda máquina de propaganda, possivelmente até expontânea, à volta do trabalho do sr. Scolari na selecção portuguesa. Centra-se em 5 falácias, a saber:
A primeira falácia é a única que tem alguma (pouca) base. É certo que levou a selecção a uma final, coisa que nunca tinha acontecido. No entanto, isso só seria extraordinário se por um lado nunca se tivesse estado sequer perto disso, ou, por outro lado, se nos abstraíssemos do contexto em que tal ocorreu. Qualquer pessoa minimamente atenta à evolução do futebol português percebe que chegar a uma final era uma questão de tempo. O bom trabalho desenvolvido a partir dos anos 80 é a razão principal, se não única, dos sucessos futebolísticos dos anos 90 e desta primeira década do século XXI. Para quem tem memória curta, eu relembro o Euro'96, onde a selecção, então (des)treinada pelo Oliveirinha, encantou a Europa, venceu o seu grupo, e só foi travada nos qurtos (tal como agora) pelo famoso chapéu do Poborsky, que haveria de jogar a final, depois de eliminar a futura campeã mundial França, e perdê-la só no prolongamento. Houve o parênteses do Mundial'98, qualificação perdida em circunstâncias inglórias. Mas seria a última a ser perdida. Em 2000 a selecção voltou a encantar a Europa, despachando na frase de grupos a Inglaterra (que já é freguesa desde 1966, última vez que nos ganhou oficialmente), a Roménia, que era então uma das mais fortes selecções da Europa e que até tinha ficado à nossa frente na qualificação, e a Alemanha, campeã em título, e que foi despachada por 3-0 pelos suplentes portugueses. Primeiro lugar no grupo, tal como em 1996, 2004 e 2008, com a diferença de ter sido no grupo mais forte de sempre, e com 3 vitórias em 3 jogos. Para abreviar razões, todos nos lembramos da eliminação já nos últimos minutos do prolongamento da meia-final, perante a campeã mundial em título, e que se sagraria dias depois campeã europeia. Depois veio a vergonha do Mundial'02, o tal que correu mal para todas as selecções europeias menos a alemã, e que teve como 3º a Turquia e 4º a Coreia. Apesar disso, a fase de qualificação foi excelente, num grupo em que estava a Holanda (outro freguês habitual).
Chegou então o consulado do sr. Scolari, que arrastou a selecção durante 2 anos de vergonha em vergonha, com derrotas sucessivas, algumas copiosas, caindo aos trambolhões no ranking da FIFA. Por várias vezes a demissão esteve no horizonte. As convocatórias desses tempos entraram no anedotário desportivo nacional. Casmurro, foi preciso perder o jogo de abertura perante uma Grécia deprimente para mudar tudo, e deitar fora (demasiado tarde) 2 anos de trabalho. Arrastou-se penosamente até aos quartos, que era o mínimo que se pedia com um grupo daqueles (a primeira vez em que Portugal não tinha a campeã em título), sofrendo até aos últimos segundos do último jogo. A jogar em casa e num grupo com a Grécia e aquela Rússia, convenhamos que é obra. A eliminação da Inglaterra, com a ajuda preciosa do árbitro, foi dramática, conseguida nos penáltis. Veio a Holanda, selecção que nunca se deu bem com o nosso futebol, e por fim a final com a inacreditável Grécia, que tinha passado aos quartos miraculosamente e com uma única vitória. Há quem justifique o injustificável dizendo que a Grécia eliminou os checos e os franceses. É certo. Com uma vaca leiteira daquelas gordas e afanadas. Mas é certo. Os franceses, numa crise indisfarçável que já vinha desde o Mundial'02 e só ficou disfarçada por uma boa ponta final no Mundial'06, foram apanhados de surpresa, e terão sido vítimas da sua sobranceria. Subestimaram uma selecção sem história no futebol internacional, e que tinha passado por milagre ortodoxo depois de ganhar a Portugal, empatar com a Espanha e perder com a Rússia. Os checos viram a forma como os franceses foram eliminados, mas pareceram não ter aprendido a lição. Finalmente, a final. O sr. Scolari, ao contrário dos checos e dos franceses, não podia ser apanhado de surpresa. Já conhecia os gregos. Já tinha jogado contra eles duas vezes, tendo empatado uma e perdido outra, semanas antes, sempre em casa. Mas quê, isso de aprender e mudar é para os outros. Cometeu a proeza - e eu não lhe retiro esse mérito, o seu a seu dono - de ter perdido uma final em casa, perante um ambiente extraordinário, diante de um grupo de bons rapazes que nunca tinham feito nada de jeito antes nem voltaram a fazer depois, e que tinham chegado à final assim como que aos trambolhões. É obra. Pior que isto só o Peseiro a perder a UEFA em casa. Mas esse ao menos tinha uma equipa a sério como adversária.
Depois veio a qualificação para o Mundial'06, e cenas inacreditáveis, como o empate contra o Lichtenstein ("é normal", disse ele depois do jogo). Qualificação mais ou menos tranquila, no grupo mais fácil de que há memória, onde só a tímida Eslováquia ainda apresentava algum risco. No entanto, não fez melhor do que o inenarrável Oliveirinha, na qualificação pra '02, num grupo que tinha a Holanda. Conseguiu até fazer pior em termos de golos marcados e sofridos. Apesar de ter o Lichtenstein no grupo. O Mundial'06 não correu mal, é verdade. Chegar às meias foi muito bom, é certo. Nem tudo foi mau, com o sr. Scolari. Mas descontextualizar isso da evolução do futebol português desde os anos 80 é chegueira ou desonestidade intelectual. Apesar de tudo, há algumas interrogações que volto a fazer: com um grupo daqueles (Angola, Irão, México), não era a obrigação mínima passar aos quartos? Perante o último assomo de uma França decadente, e depois de eliminar os fregueses habituais, não seria de pedir um pouco mais? Talvez as coisas tivessem corrido de forma diferente se não tivessem ficado em casa jogadores como o Quaresma, e não tivessem sido convocados os amigos do costume, alguns deles a recuperar de lesões, outros que não jogavam há meses, outros até sem clube na altura da convocatória. Mas tiro-lhe o chapéu. Fez um Mundial'06 bom.
Por fim, a sofrida qualificação para o Euro'08, num grupo que, sem ser ridiculamente fácil (como o do Mundial'06), era acessível. Apesar de tudo, não conseguiu melhor do que um 2º lugar garantido já na ponta final. Quanto à fase final, não vou falar, porque por circunstâncias diversas só consegui ver (e mal) o jogo contra a Turquia. Haverá quem comente muito melhor do que eu.
A segunda falácia diz que o sr. Scolari uniu os portugueses em torno da selecção. Francamente eu não sabia que tinham alguma vez deixado de estar. O que ele de facto conseguiu, a meias com o Marcelo, foi pôr os portugueses a pendurarem bandeiras made in China nas janelas e nos carros. Muito graças ao facto de ter jogado o Euro'04 em casa, com os óbvios efeitos que a proximidade física traz. Conseguiu, porém, uma proeza a que poucos têm dado o devido valor: mostrar que os portugueses nem os seus símbolos nacionais conhecem convenientemente, como se viu pela incrível quantidade de bandeiras de pernas para o ar que se viam. Mas convenhamos, pôr bandeiras à janela não revela união nem, muito menos, patriotismo. Quando muito revela mau gosto.
A terceira falácia diz que se deixou de andar de calculadora na mão, e que dantes raramente se chegava a fases finais. Falso. Andou toda a gente de calculadora numa mão e o coração na outra, em 2004, até ao último segundo do último jogo da fase de grupos. A coisa só se resolveu já nos últimos jogos, nas qualificações de 2006 e 2008, em grupos facílimos. Raramente chegávamos às fases finais? Falso. Desde que o trabalho ao nível da formação começou a dar frutos, com a chegada da "geração de ouro" à selecção principal, no início dos anos 90, só se falhou uma fase final, a do Mundial'98. De resto, estivemos em todas: Euro'96, Euro'00, Mundial'02, Euro'04, Mundial'06, Euro'08. Só os dois últimos se conseguiram graças a ele - ou apesar dele. E tirando o Mundial'02, em todos se fez boa figura, em particular no Euro'00, sem dúvida a melhor prestação portuguesa de sempre em grandes provas, aliando um excelente futebol com resultados, e frente a selecções de primeiríssima linha (com a excepção da Turquia, outro freguês usual).
A quarta falácia alega que o sr. Scolari acabou com os grupinhos e as influências. Tendo em conta que as convocatórias dele raramente constituiram surpresa, uma vez que basicamente convocava sempre os mesmos, independentemente do momento de forma, que deixava de convocar outros por razões extra-futebolísticas, que assumia o seu grupinho intocável, parece-me que só com grande sentido de humor se pode afirmar que ele acabou com os grupinhos. Sim, acabou com os grupinhos que havia antes. Mas criou outros, os dele, à pala dos quais jogadores que em outras circunstâncias nunca seriam convocados tinham livre-trânsito em todas as convocatórias. Não é que isso seja sempre negativo. Quem anda de dieta, como eu, e viu o Miguel rebolar os pneus e os refegos pescoçais no jogo contra a Suíça, fica sempre consolado - afinal é possível ter-se uns quilos a mais e continuar a jogar numa selecção nacional. Também não deixa de ser um excelente momento de humor, vindo de um seleccionador que em tempos se manifestou tão preocupado com o rabo dos seus jogadores, ameaçando não convocar os que o tivessem demasiado grande. Qual seria a bitola? Maior que o do Miguel já não dava?
A quinta falácia, finalmente, reza que antes do sr. Scolari nunca se ganhou nada, apesar de se jogar bem. Bom, e com ele, ganhou-se alguma coisa?
Já vai longa esta minha primeira intervenção facciosa. Queria acabar a dizer bem, mas é difícil, não é coisa que me esteja no sangue. Ontem ainda pensei em ver o jogo. Mas para isso teria de faltar à minha aula de Árabe, que começava antes e acabava durante. Se fosse um jogo importante do Sporting, mandava logo o Árabe às malvas. Mas entre os muitos encantos da língua dos desertos das arábias e o naufrágio previsível de uma selecção à deriva em que o patrão já está com a a cabeça noutro lado e os jogadores parecem mais preocupados com futuros contratos do que com o momento presente, não tive dúvidas na escolha, al-hamdu li-l-Lah, que é como quem diz, em língua cristã, Deo gratias.
Não sei de onde terá partido, mas há uma tremenda máquina de propaganda, possivelmente até expontânea, à volta do trabalho do sr. Scolari na selecção portuguesa. Centra-se em 5 falácias, a saber:
- Scolari levou a selecção até onde ela nunca tinha chegado;
- Scolari uniu os portugueses em torno da selecção;
- Antes de Scolari andávamos sempre de calculadora na mão e raramente chegávamos a fases finais;
- Scolari acabou com os grupinhos e as influências externas na selecção;
- Antes de Scolari jogava-se bem, nunca se ganhou nada.
A primeira falácia é a única que tem alguma (pouca) base. É certo que levou a selecção a uma final, coisa que nunca tinha acontecido. No entanto, isso só seria extraordinário se por um lado nunca se tivesse estado sequer perto disso, ou, por outro lado, se nos abstraíssemos do contexto em que tal ocorreu. Qualquer pessoa minimamente atenta à evolução do futebol português percebe que chegar a uma final era uma questão de tempo. O bom trabalho desenvolvido a partir dos anos 80 é a razão principal, se não única, dos sucessos futebolísticos dos anos 90 e desta primeira década do século XXI. Para quem tem memória curta, eu relembro o Euro'96, onde a selecção, então (des)treinada pelo Oliveirinha, encantou a Europa, venceu o seu grupo, e só foi travada nos qurtos (tal como agora) pelo famoso chapéu do Poborsky, que haveria de jogar a final, depois de eliminar a futura campeã mundial França, e perdê-la só no prolongamento. Houve o parênteses do Mundial'98, qualificação perdida em circunstâncias inglórias. Mas seria a última a ser perdida. Em 2000 a selecção voltou a encantar a Europa, despachando na frase de grupos a Inglaterra (que já é freguesa desde 1966, última vez que nos ganhou oficialmente), a Roménia, que era então uma das mais fortes selecções da Europa e que até tinha ficado à nossa frente na qualificação, e a Alemanha, campeã em título, e que foi despachada por 3-0 pelos suplentes portugueses. Primeiro lugar no grupo, tal como em 1996, 2004 e 2008, com a diferença de ter sido no grupo mais forte de sempre, e com 3 vitórias em 3 jogos. Para abreviar razões, todos nos lembramos da eliminação já nos últimos minutos do prolongamento da meia-final, perante a campeã mundial em título, e que se sagraria dias depois campeã europeia. Depois veio a vergonha do Mundial'02, o tal que correu mal para todas as selecções europeias menos a alemã, e que teve como 3º a Turquia e 4º a Coreia. Apesar disso, a fase de qualificação foi excelente, num grupo em que estava a Holanda (outro freguês habitual).
Chegou então o consulado do sr. Scolari, que arrastou a selecção durante 2 anos de vergonha em vergonha, com derrotas sucessivas, algumas copiosas, caindo aos trambolhões no ranking da FIFA. Por várias vezes a demissão esteve no horizonte. As convocatórias desses tempos entraram no anedotário desportivo nacional. Casmurro, foi preciso perder o jogo de abertura perante uma Grécia deprimente para mudar tudo, e deitar fora (demasiado tarde) 2 anos de trabalho. Arrastou-se penosamente até aos quartos, que era o mínimo que se pedia com um grupo daqueles (a primeira vez em que Portugal não tinha a campeã em título), sofrendo até aos últimos segundos do último jogo. A jogar em casa e num grupo com a Grécia e aquela Rússia, convenhamos que é obra. A eliminação da Inglaterra, com a ajuda preciosa do árbitro, foi dramática, conseguida nos penáltis. Veio a Holanda, selecção que nunca se deu bem com o nosso futebol, e por fim a final com a inacreditável Grécia, que tinha passado aos quartos miraculosamente e com uma única vitória. Há quem justifique o injustificável dizendo que a Grécia eliminou os checos e os franceses. É certo. Com uma vaca leiteira daquelas gordas e afanadas. Mas é certo. Os franceses, numa crise indisfarçável que já vinha desde o Mundial'02 e só ficou disfarçada por uma boa ponta final no Mundial'06, foram apanhados de surpresa, e terão sido vítimas da sua sobranceria. Subestimaram uma selecção sem história no futebol internacional, e que tinha passado por milagre ortodoxo depois de ganhar a Portugal, empatar com a Espanha e perder com a Rússia. Os checos viram a forma como os franceses foram eliminados, mas pareceram não ter aprendido a lição. Finalmente, a final. O sr. Scolari, ao contrário dos checos e dos franceses, não podia ser apanhado de surpresa. Já conhecia os gregos. Já tinha jogado contra eles duas vezes, tendo empatado uma e perdido outra, semanas antes, sempre em casa. Mas quê, isso de aprender e mudar é para os outros. Cometeu a proeza - e eu não lhe retiro esse mérito, o seu a seu dono - de ter perdido uma final em casa, perante um ambiente extraordinário, diante de um grupo de bons rapazes que nunca tinham feito nada de jeito antes nem voltaram a fazer depois, e que tinham chegado à final assim como que aos trambolhões. É obra. Pior que isto só o Peseiro a perder a UEFA em casa. Mas esse ao menos tinha uma equipa a sério como adversária.
Depois veio a qualificação para o Mundial'06, e cenas inacreditáveis, como o empate contra o Lichtenstein ("é normal", disse ele depois do jogo). Qualificação mais ou menos tranquila, no grupo mais fácil de que há memória, onde só a tímida Eslováquia ainda apresentava algum risco. No entanto, não fez melhor do que o inenarrável Oliveirinha, na qualificação pra '02, num grupo que tinha a Holanda. Conseguiu até fazer pior em termos de golos marcados e sofridos. Apesar de ter o Lichtenstein no grupo. O Mundial'06 não correu mal, é verdade. Chegar às meias foi muito bom, é certo. Nem tudo foi mau, com o sr. Scolari. Mas descontextualizar isso da evolução do futebol português desde os anos 80 é chegueira ou desonestidade intelectual. Apesar de tudo, há algumas interrogações que volto a fazer: com um grupo daqueles (Angola, Irão, México), não era a obrigação mínima passar aos quartos? Perante o último assomo de uma França decadente, e depois de eliminar os fregueses habituais, não seria de pedir um pouco mais? Talvez as coisas tivessem corrido de forma diferente se não tivessem ficado em casa jogadores como o Quaresma, e não tivessem sido convocados os amigos do costume, alguns deles a recuperar de lesões, outros que não jogavam há meses, outros até sem clube na altura da convocatória. Mas tiro-lhe o chapéu. Fez um Mundial'06 bom.
Por fim, a sofrida qualificação para o Euro'08, num grupo que, sem ser ridiculamente fácil (como o do Mundial'06), era acessível. Apesar de tudo, não conseguiu melhor do que um 2º lugar garantido já na ponta final. Quanto à fase final, não vou falar, porque por circunstâncias diversas só consegui ver (e mal) o jogo contra a Turquia. Haverá quem comente muito melhor do que eu.
A segunda falácia diz que o sr. Scolari uniu os portugueses em torno da selecção. Francamente eu não sabia que tinham alguma vez deixado de estar. O que ele de facto conseguiu, a meias com o Marcelo, foi pôr os portugueses a pendurarem bandeiras made in China nas janelas e nos carros. Muito graças ao facto de ter jogado o Euro'04 em casa, com os óbvios efeitos que a proximidade física traz. Conseguiu, porém, uma proeza a que poucos têm dado o devido valor: mostrar que os portugueses nem os seus símbolos nacionais conhecem convenientemente, como se viu pela incrível quantidade de bandeiras de pernas para o ar que se viam. Mas convenhamos, pôr bandeiras à janela não revela união nem, muito menos, patriotismo. Quando muito revela mau gosto.
A terceira falácia diz que se deixou de andar de calculadora na mão, e que dantes raramente se chegava a fases finais. Falso. Andou toda a gente de calculadora numa mão e o coração na outra, em 2004, até ao último segundo do último jogo da fase de grupos. A coisa só se resolveu já nos últimos jogos, nas qualificações de 2006 e 2008, em grupos facílimos. Raramente chegávamos às fases finais? Falso. Desde que o trabalho ao nível da formação começou a dar frutos, com a chegada da "geração de ouro" à selecção principal, no início dos anos 90, só se falhou uma fase final, a do Mundial'98. De resto, estivemos em todas: Euro'96, Euro'00, Mundial'02, Euro'04, Mundial'06, Euro'08. Só os dois últimos se conseguiram graças a ele - ou apesar dele. E tirando o Mundial'02, em todos se fez boa figura, em particular no Euro'00, sem dúvida a melhor prestação portuguesa de sempre em grandes provas, aliando um excelente futebol com resultados, e frente a selecções de primeiríssima linha (com a excepção da Turquia, outro freguês usual).
A quarta falácia alega que o sr. Scolari acabou com os grupinhos e as influências. Tendo em conta que as convocatórias dele raramente constituiram surpresa, uma vez que basicamente convocava sempre os mesmos, independentemente do momento de forma, que deixava de convocar outros por razões extra-futebolísticas, que assumia o seu grupinho intocável, parece-me que só com grande sentido de humor se pode afirmar que ele acabou com os grupinhos. Sim, acabou com os grupinhos que havia antes. Mas criou outros, os dele, à pala dos quais jogadores que em outras circunstâncias nunca seriam convocados tinham livre-trânsito em todas as convocatórias. Não é que isso seja sempre negativo. Quem anda de dieta, como eu, e viu o Miguel rebolar os pneus e os refegos pescoçais no jogo contra a Suíça, fica sempre consolado - afinal é possível ter-se uns quilos a mais e continuar a jogar numa selecção nacional. Também não deixa de ser um excelente momento de humor, vindo de um seleccionador que em tempos se manifestou tão preocupado com o rabo dos seus jogadores, ameaçando não convocar os que o tivessem demasiado grande. Qual seria a bitola? Maior que o do Miguel já não dava?
A quinta falácia, finalmente, reza que antes do sr. Scolari nunca se ganhou nada, apesar de se jogar bem. Bom, e com ele, ganhou-se alguma coisa?
Já vai longa esta minha primeira intervenção facciosa. Queria acabar a dizer bem, mas é difícil, não é coisa que me esteja no sangue. Ontem ainda pensei em ver o jogo. Mas para isso teria de faltar à minha aula de Árabe, que começava antes e acabava durante. Se fosse um jogo importante do Sporting, mandava logo o Árabe às malvas. Mas entre os muitos encantos da língua dos desertos das arábias e o naufrágio previsível de uma selecção à deriva em que o patrão já está com a a cabeça noutro lado e os jogadores parecem mais preocupados com futuros contratos do que com o momento presente, não tive dúvidas na escolha, al-hamdu li-l-Lah, que é como quem diz, em língua cristã, Deo gratias.
7 comentários:
Já volto mais logo com uma leitura atenta, mas desde já um voto de estadia boa e prolongada.
Estás no meio de homens. Digo eu.
Estava na hora de responderes por posts de peito aberto ao mundo faccioso, tão mal representado por nós. Damos o nosso melhor.
Pensando bem, se calhar volto mais no fim do fim-de-semana, porque depois desta tua entrada e lendo o comentário do Aquila, tenho receio de não corresponder a tamanhas peças literárias. :)
A ver vamos se nos desentendemos porque isto de concordar com a tua opinião espero aplicar-se apenas ao amor que tínhamos pelo Scolari.
Seja bem-vindo, Mestre André.
A presença já era assídua e o facciosismo notório. É uma excelente contratação para a lagartada facciosa e um desafio saudável para os restantes.
Quanto ao Scolari, apesar do "mito" que foi criado à sua volta, penso que o seu desempenho foi razoável (faço parte do rebanho que, criticando-o enquanto por cá andou, o elogia na despedida).
A rapaziada do Chelsea é que poderá estranhar ter de trocar as discussões [tácticas] por rezas à Senhora do Caravaggio :-)
N.B.: Corrigi a minha gaffe :-)
Willkommen ;)
Apesar de ter dormitado um pouco ao longo do teu post ;), fico contente por demonstrares que não são só os Portistas a terem uma visão depreciativa do trabalho do Sargentão.
Aproveitando-me da tua exposição, a qual secundo completamente, acrescento esta minha conclusão que remonta a 2003 e nunca teve motivo de revisão:
Scolari é um treinador banal e um selecionador medíocre!
Obrigado a todos pelo acolhimento! Como não percebo nada de futebol tenho a vantagem de poder dizer os disparates todos que me passam pela cabeça ;)
Eu também subscrevo a opinião de que é um treinador banal e um seleccionador medíocre. Foi campeão do mundo, é verdade. Mas daquela equipa brasileira se podia dizer o mesmo que do benfica dos anos 60 e 70 e do porto actual: qualquer treinador se arriscava a ser campeão. E num mundial onde desde muito cedo ficaram pelo caminho França, Itália, Argentina, entre outros, e a Holanda nem lá chegou (eliminada na qualificação pela selecção do Oliveirinha) e onde na final apareceu uma Alemanha inofensiva, como se tinha visto no Euro anterior e se veria no seguinte, convenhamos, é interesante, mas não é fantástico. De resto a vergonha que foi a fase de preparação para o Euro'04 mostrou-o à saciedade. O que me leva de novo a interrogar: com um seleccionador/treinador a sério, que não tivesse perdido 2 anos com convocatórias dignas dos melhores momentos dos Malucos do Riso e com tácticas que nem eu, que de futebol não percebo nada - com um seleccionador/treinador a sério que tivesse feito o trabalho de casa durante os 2 anos de preparação, e que não tivesse sido obrigado a mudar tudo de repente por causa de uma derrota previsível contra uma equipa de 3ª linha, até onde se teria chegado no Euro'04? É que chegar à final, depois dos Euro'96 e sobretudo Euro'00, jogando em casa contra equipas acessíveis na fase de grupos, e nas eliminatórias contra equipas que tradicionalmente não se entendem com o futebol português, chegar à final neste contexto não me parece nada de extraordinário.
Quanto à defesa que muitos lampiões e sportinguistas fizeram dele, parece-me que na maior parte dos casos foi tipo reflexo pavloviano: se os portistas não gostam dele, então a gente tem de gostar. Não consigo encontrar outra explicação.
Só pode ter sido por isso mesmo, André. Partiram do princípio que era puro embirre por o homem ter afastado na altura o melhor GR de Portugal, sem dar o menor cavaco.
Mas eu lembro-me bem da tardia convocatória do R. Carvalho, por todos e há muito considerado o melhor central Português, como o desesperante desaproveitamento do tridente fabuloso do meio-campo Portista que só foi utilizado em desespero de causa.
Assim como este ano não deu uma única oportunidade ao Quim, qd este fez qt a mim a melhor época no Benfica.
Enfim, tb é certo que não poderíamos esperar mais do que isto de um seleccionador sempre agarrado ao sofá, né?!
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