As minhas tardes da década de 80, passei-as metido no mesmo café da aldeia, o café do Bessa. Durante os loucos anos da brilhantina, permaneci nesse ambiente durante as maiores e mais severas crises de acne. Pelo menos uma vez por dia regressava a casa na Piaggio pk50 com o capacete integral GPA que cobria, por completo, as crateras activas. Nunca questionei aquela rotina. Nunca pensei muito sobre isso. Aliás, raramente pensava. Não tinha lá muito tempo, nem sequer hormonas para tão supérflua actividade celular. Na cabeça aqui do teenager havia três preocupações principais: sair de casa para o café, voltar do café para buscar mais moedas e, a terceira agitação, a de regressar ao Bessa sem que ninguém tivesse aberto o bilhar.
No café, a companhia era a que se podia arranjar. Raramente se ouviam frases com mais de três palavras católicas seguidas e, quase todos se catalogavam filhos da mesma meritíssima mãe. Era uma família unida. Quando alguém mandava alguém para perto da zona púbica mais velha, acabavam todos por irem também e sem grandes confusões. Nunca questionei aquele ambiente. Sabia que não era nenhuma sacristia pois o padre não gostava de bilhar. Pelo menos o bilhar normal. Talvez a outra forma, aquela que se apelida "de bolso". Talvez essa, mas a de 6 buracos não.
No café do Bessa, a comida era quase cozinhada. Dava para perceber o tipo e a data de validade. Não quero que fiquem com uma imagem errada. Aliás, o cachorro-quente vinha com muita mostarda e, quase sempre com salsicha. A cerveja, essa saía para a mesa um bocadinho mais rápida que o cachorro, chegando muitas vezes antes da última bolha de ar definhar por completo no topo do copo. Era um serviço 5 estrelas.
As minhas tardes eram estupidamente previsíveis. Porque raios voltava eu àquele antro? Não sabia na altura mas sei-o agora.
Todas estas memórias para vos dizer que, quando hoje me cruzei com a corrida dos lampiões, a caminho do cesto de pão, percebi porque é que, durante toda a minha puberdade, nunca mudei de café. Não mudei porque não conhecia melhor. Não mudei porque não sabia outro caminho, não conhecia outro café, não sabia que existiam outros cafés. Isto tudo para vos dizer, caros leitores, que não percebo porque é que ainda existem lampiões. Troquem lá o cartão. Escolham aquele que é hoje o melhor "café" da aldeia. Vamos lá festejar os 50 pontos do Futebol Clube do Porto.
Não vêm? Não percebo.
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